segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Tu és

Mudei o lugar da barraca
depois que aquela gata chegou na areia//

Pensa num hit baiano
e ela dançando o corpo de sereia//

Deu uma idéia e uma esperança
vou me inscrever num curso de dança//

Depois deitou na canga e deixou o sol fazer o resto
a pele bronzeada brilhando no biquini nada modesto//

Não tinha mais como olhar reto
e olha que eu tava sendo discreto//

Chama atenção de quem passa e eis o mistério
pra conquistar essa gata que me tira do sério//

Nem marca de biquini ela tinha
por isso desamarrou a parte de cima//

Mais tarde foi jogar altinha
até tinha de fora mas ninguém se atrevia//

O sol esquenta o asfalto e a areia fina
e queira ou não queira faz brotar o suor//

Se deixar te levo pra Abricó
bronzear o corpo inteiro é ainda melhor//

Porque tu és
divina e graciosa//

Musa da minha bossa

Mulher

Vou aprender futebol//

terça-feira, 13 de maio de 2014

Recado dado

Agora eu sempre ando com uma caneta
não é bic, é pilot atômico
e pesa
uma tonelada

E o recado é dado

Em qualquer parede, poste, muro, teto ou piso
largo palavras
cito, recomendo, xingo
e deixo também alguns pensamentos
íntimos
anonimamente
covardemente
gentilmente

Não me pediram mas eu faço
se não gostou pega um pano e álcool

Mas o recado já foi dado

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Cai Faz Ai

Cai
num zigue zague longo
a folha seca//

Faz
um estrondo
sem que se perceba//

Ai
de mim outono
amar é primavera//

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Carta a Cabral

I
Ei velho Cabral, veja só que sorte,
já inventaram o tele-transporte!//
Faz Rio-Lisboa em poucas horas
e assim como vai, também volta//

Ir às Índias, agora é um pulo
e querendo dar a volta ao mundo,
basta fechar a escotilha//

Mas antes que se lamente à toa,
saiba: não é tão bom como soa//
Deu-se fim a viagem,
já não se descobre novas paisagens//

Guiado via satélite, não hesita;
segue estrelas inventadas
e faz o que lhe ditam//

Triângulo das Bermudas, agora é concorrido
e vou à Salvador, só pra folia//
Hora de chegada e hora de partida,
é dar muita chance ao imprevisto//

Voa tão alto, que abaixo, pouco vê;
de nariz empinado,
apontado pro céu//

II
Aventura, fica por conta do filme na tv,
distrações para preencher o vazio//
A pressa pelo objetivo faz esquecer,
que ‘perder-se também é caminho’//

Segurança no cinto, máscara de ar,
permaneçam em seus assentos,
já vamos chegar//

Seguindo o roteiro, sem sair da fila,
típica comida: sabor globalizado//
tudo preparado, com boa antecedência,
para te apresentar ao estereotipado//

Ouvir a voz do guia, olhar para onde aponta;
fingir que não se dá conta
da criança na esquina//

Veja que bonito, oh!, como é belo;
pontos turísticos, prontos para agradá-lo//
Lembrancinhas, souvenirs, fotografias;
se ganhassem cicatrizes, não esqueceriam//

E depois, é malas prontas,
já estamos de partida!
Tamanha correria, também na despedida//

III
Chegar em casa é aquela tristeza,
dá depressão e até jet-lag//
A vida é mesmo uma dureza,
o psiquiatra que te aguarde!//

E se antes eram loucos os que navegavam,
parece que hoje a viagem enlouquece.
Pois está tudo a um só click, na internet//

A cidade onde vive, ainda desconhece
e pouco sabe de seu vizinho de porta//
Mas planeja com antecedência quando irá
a próxima vez para a Europa//

Agora já sei, amigo Cabral,
que a Terra é redonda e gira em torno do sol;
suspensa no vazio do vazio da alma, daquele que é só//

Cedo ou tarde a gente se encontra
e você me conta sobre o que é viajar//
Afinal, por que ir tão longe,
se não quer sair do lugar?//

Imagino que deves sentir saudades,
dos 7 mares e daqueles dias//
Quando ainda acreditava-se em ilhas desconhecidas//

segunda-feira, 28 de abril de 2008

O Bote














Logo após a ventania veio a chuva, forte, fria e pesada, assustadora de verdade. O vento em popa inflava as velas e o mar se agitava; as ondas faziam o barco inclinar em ângulos perigosos e a nobre tripulação esforçava-se em manter-se a bordo, baixar as velas e controlar a embarcação.

A pequena Caravela era corajosa e enfrentava as ondas com decisão. O mar estava completamente revolto, grandes ondas agora formavam-se em várias direções, a chuva castigava.

É dever das Embarcações Reais, que querem gozar de honra e prestígio, serem capazes de transportar seus tripulantes com segurança e precisão ao comando das velas. As Embarcações Reais são imponentes e por onde passam arrancam suspiros e pensamentos aventureiros por parte dos marinheiros.

A Caravela em questão não é das maiores, já navega com meia dúzia de homens, mas é bela e elegante. A viagem é curta e a tempestade, inesperada: além da tripulação e seus pertences, a Caravela puxa atrás de si, à reboque, um bote, para 11, 12, pessoas no máximo. O Bote, de madeira grossa e esbranquiçada do sal e do sol, ao contrário, não recebe nenhuma atenção dos homens nesse momento de perigo. As ondas lhe acertam de todos os lados enquanto é puxado com trancos secos que fazem o cabo estalar. Parte da tripulação assume os remos, alguns ainda terminam de lidar com as velas, a Caravela enche o peito e segue em frente.

Entre os Botes, porém, também existe Beleza, e Este bote em particular era dos mais Belos. Os Botes Verdadeiros são aqueles que sabem-se botes, amam-se botes e desempenham seu papel da melhor maneira possível.

Botes não têm mastro para serem autônomos, tampouco leme para escolher direção. Para os Botes Verdadeiros, obediência e fidelidade à nobre tripulação, devem estar acima de sua própria existência, tal é a dedicação.

Se agora Ele estava em segundo plano, sabe que chegará a oportunidade em que será vital, será a embarcação principal. Os navegantes precisariam dele. Essa hora se dá quando, uma vez ancorados próximo à praia, ele desempenha seu papel de Barco-de-apoio e é responsável pelo transporte terra-mar.

Os bons Barcos-de-apoio são valorosos na sua função e a exercem com alegria, é o que ensinam os mais velhos. Quando estão sendo apenas rebocados, não devem chamar a atenção ou dar trabalho, porém quando a Embarcação Real ancora, ele sim, navega. A nobre tripulação deve ficar protegida e a salvo em sua concavidade; esse é o trabalho dos Barcos-de-apoio.

Aos olhos dos que vivem nas superfícies, talvez os Botes lhe pareçam menos bravos ou honrados que as Caravelas ou Veleiros, mas isso é porque desconhecem que no Reino do Mar existe a Harmonia das sábias Águas Profundas. O destino final de toda e cada embarcação, o Fundo do Mar, a companhia dos peixes, as águas tranqüilas. A Honra máxima que um Barco pode ter: afundar com dignidade, tendo navegado uma vida plena e desistido nunca.

E era contra a morte que todos ali, agora lutavam. Os esforços de ambas embarcações, no entanto, não são para salvar suas existências, mas a de sua nobre tripulação. A chuva estava grossa que machucava as costas e os homens a bordo remavam com toda força graças ao frio que anestesiava as mãos que se esfolavam. Os pingos caíam gelados e as ondas agora já tinham 4, 5 metros.

Enquanto isso, sem que qualquer perceba, o Bote, atrás de todos, estava rapidamente enchendo-se de água da chuva e principalmente das ondas que aos poucos acumulavam-se no seu fundo. Ninguém parecia notar que ele esforçava-se para resvalar da melhor maneira que podia, sem muito sucesso, e engolia mais um grande gole de onda salgada. De sua parte, também não quis falar nada; era preciso que os homens cuidassem da Caravela, - pensou -, já havia problemas demais para que ele apresentasse mais um.

Por alguns momentos a quantidade de água que se acumulava no fundo, permaneceu estável, apesar de a cada mergulho encher-se mais um pouco, para então esvaziar-se novamente o mesmo pouco. Quando uma seqüência terrível de ondas por pouco não fez virar a Caravela, foi o suficiente para encher o Bote mais do que ele conseguia esvaziar em tão pouco tempo. Apenas então, um dos marinheiros notou o que estava acontecendo e abandonou o remo entre escorregões e muita água, para tentar puxar o Bote pelo cabo, porém já era tarde demais. Em 3 longos segundos desapareceu suavemente sob as ondas, mas como estava amarrado, ficou com parte da proa visível e passou a funcionar como âncora para os homens que tentavam a todo custo tirar a Caravela da tempestade.

Então, sem pestanejar, o marinheiro correu para uma cabine lateral e voltou com um facão. O cabo era grosso, mas de tão esticado que estava, foi fácil cortá-lo em 2 vezes.

O Bote naufragara e a Caravela já manobrava no sentido contrário das nuvens escuras. Ainda empinava e inclinava, sacudia, mas a tempestade já não era a mesma e tampouco os tripulantes. Haviam perdido o Bote, que entregara-se ao Mar como quem entrega-se aos braços da mãe e então tudo acalmou-se.

Ainda chovia, e o vento assobiava por entre os cabos e os cabelos.

45 metros abaixo do nível do mar o silêncio era total, quando o Bote, descendo lentamente como uma folha seca que cai do galho, atingiu o fundo e tombou de lado, fez um baque surdo e levantou uma nuvem de areia cintilante. Logo depois aterrissou a ponta do cabo e tudo continuou como era antes.

domingo, 6 de abril de 2008

Telegrama ou SMS















Olá!

Aqui, mta correria, vc td bem??

Eu, saudades suas, vc tb??

Agora mta chuva, fecha a janela, hein!?

e lembra q eu te amo mais hj, do q amava ontem!!

quinta-feira, 20 de março de 2008

João Antônio II (em 2 partes)

- E, uma vez tomada a decisão, quis voltar imediatamente. PRECISAVA voltar, antes que fosse tarde demais e estivesse completamente tomado pela cidade, isso seria um caminho sem volta. João Antônio estava dizendo basta à esse suor do mal, à esse caos, esse cinza. Precisava sair daquele torpor, voltar para o ar fresco, emergir. Não agüentava mais o maldito 498 de cada dia e seus trancos descadeirantes, não agüentava mais as prostitutas, nem o cigarro. Nem o penteado, nem as roupas que vestia e o cheiro que cheirava. Imaginava que teria envelhecido 10 anos em 2, sentia que as rugas haviam cavado pela sua pele seca, sentia a fuligem no suor, sentia uma sujeira que não se tira com banho; e era isso que ele levaria de volta, sujeira.

Foi só o tempo de arrumar as malas e já estava partindo. Despediu-se apenas de uma pessoa: o cachorro da casa. Dois dias depois, João estava saltando na rodoviária de sua cidade. Não avisou a ninguém que estaria voltando, apenas voltou. Foi bem recebido, matou a saudade dos amigos e familiares e por conta disso, passou quase um mês inteiro em reencontros, celebrações e reuniões. Todas esses encontros fizeram com que se parecesse um pouco como um ex-cativo em processo de re-socialização, mas, mais uma vez, não importava, já estava sentindo-se bem melhor, pelo menos. Agora iria arrumar um trabalho e tudo ficaria perfeito. Aceitaria pouca coisa, sabia que estivera fora por quase 2 anos e além de estar com o peso em alta e o vigor em baixa, ficara também, fora do ‘mercado’ tempo demais e, trabalho, pra trabalhar em fazenda, só se consegue com indicação só.

Mas o problema era justamente esse: João não estava conseguindo trabalho. Tirava um dinheiro aqui e ali, mas só e pelo menos e mal, dava para pagar o que comia. Vivendo de favor na casa de primos, a situação já estava ficando chata.

Num certo domingo, João saiu cedo de moto até a cidade vizinha, para participar de um rodeio que se inscrevera com antecedência. Desde que voltara do Rio, e isso já tinha bem uns 7 meses, ainda não competira em torneios, mas estivera treinando, com um boi bravo do primo. O primo que não lhe falou nada para não incentivá-lo demais, achou que João, inexplicavelmente, retornara montando melhor do que quando foi.

No domingo do torneio, estava um dia bonito, o céu bem azul, sem uma nuvem, sol das 11 horas. A temperatura não era necessariamente quente, mas o sol já estava queimando. Enquanto isso, João Antônio estava prestes a fazer sua corrida e por isso estava concentrado: teria 3 chances em 3 dias, para fazer o melhor tempo e pontuação. Precisava uma única tentativa que desse certo. Ele estava, mais uma vez, dando-se a chance de ser o que pensava que poderia ser. Esta seria a última, se falhasse, contentaria-se em ser um peão de fazenda e nunca mais tocaria no assunto. Mesmo com esses pensamentos, João sentia-se tranqüilo, com o coração batendo forte, mas confiante, estranhamente confiante.

Assim que montou no touro, abriram a grade; segurou-se com força na tira de couro, e o touro largou em disparada, com rodopios, sacolejando, coiceando, levantando poeira e jogando seu chapéu longe. Em câmera-lenta, João sentia os solavancos e o sol quente e viu aquele monte de gente na platéia; sua mão direita estava firme na correia embora o touro pulasse como um louco. João sentiu-se completamente familiar com aquela situação e à vontade. Não sabia porque, mas ele talvez tivesse voltado mais selvagem da cidade. Enquanto seu corpo era sacudido em todas as direções, João mantinha-se firme e lembrou-se da Avenida Brasil e do 498. A arena era quase a mesma e a situação, muito parecida. Agora ele sabia, que sobrevivera ao Rio e ao 498 mantido apenas pelo braço, fora garçom, recebera muitas ordens, tentara suportar e equilibrar as exigências de outros, tantos outros. O ônibus que vai desvairado pela Avenida Brasil tem muitos cavalos de potência, por que ele não seria capaz de resistir a apenas um touro? Sentiu-se realmente capaz de sair de lá, campeão do torneio. 2 e 500, na hora, na mão. E fôlego para tentar manter-se no topo.

Esses pensamentos tomaram 8 segundos na cabeça de João, que no 9º segundo, foi atirado ao chão com violência. Caiu de lado, com o ombro do braço que já fraturara e meio de cabeça também. O touro já estava atrás dos palhaços e duas pessoas entraram correndo na arena para socorrê-lo, mas antes que pudessem chegar até ele, João levantou-se e acenou, não havia sofrido nada.

A platéia gritava, 9 segundos é um ótimo tempo e João Antônio vibrava. Os juízes dão notas para a ‘agressividade’ do touro e para a atuação do peão. Ao final do torneio, que durou 3 dias, aconteceu que sim, João Antônio foi o grande campeão e revelação, notícia do jornal local. E depois desse torneio, de muitos outros também, João Antônio foi campeão; despontou, cresceu, foi vitorioso, destaque por muitos anos. Virou um ícone do movimento Sertanejo no Brasil, comparecia ao Faustão regularmente, ficou rico, escreveu livros, deu palestras, workshops, vendeu rações para cachorros, cavalos e peixes, botas e cintos de couro.

Nos seus livros, ele extrai lições de sua vida de sucesso; nas palestras, conta sobre sua trajetória, sua persistência e ensina à empresários que o mundo dos negócios é como equilibrar-se num touro bravo, onde o touro é o mercado e os trabalhadores são as amarras de couro.

João Antônio, atualmente, adora o Rio, mas apenas como turista, tanto é que ainda mora no interior de São Paulo e passa férias no Pantanal. Viaja de avião, anda de carro com motorista e ar-condicionado, tudo acolchoado, mas não se esquece das poltronas duras do 498. Porque foi no arredio 498 que João Antônio domava todos os dias, que ganhou resistência e aprendeu absorver os impactos do caminho. No esforço para manter-se em seu lugar, todos os dias pela Brasil, tornara-se casca-grossa, experiente, malandro.